Iniciamos um novo ano litúrgico e um novo tempo – o Advento. O termo vem do latim e significa chegada, vinda. Portanto, estamos no tempo da vinda do Senhor. Duas são as vindas do Senhor: a primeira já aconteceu, a sua a vinda na carne; a segunda será a sua vinda na glória. Os dois primeiros domingos do advento se ocuparão da vinda na glória, portanto serão domingos escatológicos. Depois nos ocuparemos da vinda na carne, mais próximo da reflexão natalina.
Podemos falar de muitas vindas do Senhor. As situações históricas são verdadeiros juízos de Deus: as crises advindas das perseguições, guerras e terrorismos já julgam o mundo com as suas consequências, condenando o mundo com os seus egoísmos. Por outro lado, há também sinais mais positivos da vinda de Cristo – as parusias (vindas) de Deus na história: os santos, os reformadores, os concílios, o serviço aos pequenos, os gestos de amor... Deus bate à porta e vem ao encontro da humanidade constantemente. É preciso que reconheçamos a presença de Deus na história humana, pois foi assim toda a história do Povo de Deus.
O tema da vinda do Senhor nos leva, neste domingo, a acendermos a vela da vigilância. O Senhor virá como o dono da casa. Quando chegar, desejará que seus empregados estejam atentos ao cuidado de sua residência. Portanto, a nossa história não é um lugar de espera. A expectativa vigilante não nos coloca como passageiros no portão de embarque. A vigilância nos leva a perceber a presença do Senhor na história e a provocar suas vindas.
Há sempre o risco do sono, como conta Jesus na parábola. A vida pode facilmente se tornar uma rotina que nos coloca na inércia, na repetição constante. Então caímos na pastoral da conservação. Isso não acontece somente no âmbito da comunidade, quando não se desejam mudanças de práticas pastorais rotineiras, mas há também uma “pastoral da conservação” no modo de se lidar com os problemas, com a família, com as relações humanas, com a vida social... O cristão não é um conformado com o que se sucede, mas procura limpar a casa sempre que percebe sinais de sujeira, organizar as coisas, quando há bagunça. De algum modo, isso prepara e apressa a vinda do dono da casa.
A vigilância é, no entanto, limitada. Vivemos a experiência que marcou o povo de Israel que estava no exílio da Babilônia, como retrata o profeta Isaías na primeira leitura: “somos como um pano sujo, murchamos todos como folhas....” Por isso, não confiamos exclusivamente nas nossas forças. É preciso nos reconhecer como pobre argila nas mãos do oleiro: “Assim mesmo, Senhor, tu és nosso pai, nós somos barro; tu nosso oleiro, e nós todos, obras de tuas mãos” (Is 64,7).
Se somos barro nas mãos do pai, o Reino definitivo não depende somente de nossas forças, como nos diz Gustavo Gutiérrez: “A esperança cristã abre-nos, em atitude de infância espiritual, ao Dom do futuro prometido por Deus, evitando-nos toda confusão do reino com uma etapa histórica determinada, toda idolatria ante um êxito humano inevitavelmente ambíguo, toda absolutização da revolução. (...) Esperar em Cristo é, ao mesmo tempo, crer na aventura histórica, o que abre um campo infinito de possibilidades ao amor e à ação do cristão.”
Contando com a força divina, pedimos ao Senhor o dom da perseverança para que nossa vigilância seja constante: “É ele que vos dará perseverança em vosso procedimento irrepreensível, até o fim, até o dia de nosso Senhor Jesus Cristo” (1Cor 1,8).
“Com efeito, ´eterno` suscita em nós a ideia do interminável, e isto nos amedronta; ´vida`, faz-nos pensar na existência por nós conhecida, que amamos e não queremos perder, mas que, frequentemente, nos reserva mais canseiras que satisfações, de tal maneira que se por um lado a desejamos, por outro não a queremos. A única possibilidade que temos é procurar sair, com o pensamento, da temporalidade de que somos prisioneiros e, de alguma forma, conjecturar que a eternidade não seja uma sucessão contínua de dias do calendário, mas algo parecido com o instante repleto de satisfação, onde a totalidade nos abraça e nós abraçamos a totalidade. Seria o instante de mergulhar no oceano do amor infinito, no qual o tempo – o antes e o depois – já não existe. Podemos somente procurar pensar que este instante é a vida em sentido pleno, um incessante mergulhar na vastidão do ser, ao mesmo tempo que ficamos simplesmente inundados pela alegria” (Spe Salvi – Bento XVI).
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